Hoje começamos uma nova série, com
o objetivo de apresentar escritoras russas para além de Marina Tsvetaeva, Anna
Akhmatova, e das mais modernas Tatiana Tolstaia e Liudmila Petruchévskaia.
E nossa jornada começa lá no
Século XVIII, com ANNA PETROVNA BUNINA (1774 - 1829), poetisa e tradutora de
renome em sua época, considerada "a primeira poetisa russa" e
apelidada pelos contemporâneos de Safo Russa, Décima Musa, Corina do Norte.
Descendem da mesma linhagem que
ela o poeta e tradutor Vassíli Jukóvski (1783 - 1852), o escritor Ivan Bunin
(1870 - 1953) e o respectivo irmão, o literato Iuli Bunin (1857 - 1921), além
da poetisa Anna Akhmatova (1889 - 1966).
Anna perdeu a mãe cedo e foi
criada pela tia, em cuja casa recebeu instrução básica: aprendeu a ler,
escrever, e as quatro operações aritméticas — o que, na época, já era
considerado mais que o suficiente para uma moça.
Apesar disso, ela começou a
escreveu poesia aos treze anos. Na revista "Ippokrena", em 1799, foi
publicada sua primeira obra, o fragmento em prosa "Amor".
Em 1802, após a morte de seu pai,
Anna, então com 28 anos, foi visitar o irmão em São Petersburgo, e resolveu se
estabelecer na capital, com os recursos deixados pelo pai. Instalou-se em um
apartamento na Ilha de Vassiliev e dedicou-se à própria educação: pôs-se a
estudar física, matemática, francês, alemão e inglês, e, principalmente,
literatura russa.
O custo de vida em São
Petersburgo consumiu a herança de Bunina em menos de dois anos, e ela começou a
contrair dívidas. Então seu irmão, um oficial da marinha, começou a
apresentá-la aos literatos da capital, a quem Anna mostrou suas obras. Em 1806,
começaram a sair na imprensa seus primeiros poemas, e em 1809 foi publicada sua
primeira antologia poética, "Musa inexperiente", que granjeou uma
ótima recepção do público e levou a imperatriz Elizavieta Alekseieva a conceder
uma pensão anual de quatrocentos rublos à autora.
Novas obras saíram ao longo da
década seguinte, tanto traduções do francês (as "Regras da poesia",
de Charles Batteux, a "Arte poética", de Nicolas Boileau, entre
outros), quanto poemas e prosa: "Poemas safísticos", "Imitação
da poetisa de Lesbos", "Noites rurais", "Canção a Aleksandr,
o Grande, vitorioso sobre Napoleão e restaurador de reinos".
Em 1815 ela descobriu que tinha
câncer, e foi se tratar na Inglaterra, permanecendo lá até 1817, onde entrou em
contato, por carta, com Walter Scott. Quando voltou à Rússia, concederam-lhe
uma pensão vitalícia, e ela passou os últimos anos da sua vida entre Moscou e o
campo, com a doença se agravando e pondo fim ao seu trabalho literário. Faleceu
em 1829 e foi enterrada em sua
Nos últimos meses de vida, até
ficar deitada era-lhe desconfortável, e ela passava a maior parte do tempo de
joelhos. Diz-se que lia muito a Bíblia em suas últimas semanas. Um de seus
últimos poemas, "Para os entes queridos" (К ближным), fala sobre esse
período sofrido.
Eis um fragmento dele:
Eis um fragmento dele:
Amar-me ou não, sentir ou não piedade
Agora, queridos!, como quiserdes, façais
Mal o espírito sai do corpo, em liberdade
De amor e pena nós não precisamos mais.
Любить меня и нет, жалеть и не жалеть
Теперь, о ближние! вы можете по воле.
Едва из тела дух успеет излететь.
Нам жалость и любовь не нужны боле.
Ela se inspirava nos poetas
gregos e romanos (Safo, Ovídio, etc.), escrevendo meditações filosóficas e
hinos de louvor aos heróis mortos em campos de batalhas (como o poema em homenagem ao Capitão Rostislav Ivanovitch Zakharov, publicado mais cedo aqui na
página). Esse estilo, em voga na época, agradou Derjavin, Dmitriev, Krylov
e outros escritores famosos de então, que nomearam Anna Bunina membra honorária
de seu grupo literário "Conferência dos amantes da palavra russa"
(Беседа любителей русского слова). Já os membros da geração literária seguinte
— como Púchkin — ironizavam a retórica pomposa de Bunina.
Ela também escrevia, porém,
poemas líricos pessoais, íntimos e carregados de sentimento, que carregaram seu
nome através dos séculos. O poeta e escritor Evgueni Evtushenko (1932 – 2017) dedicou-lhe
o poema “Anna Primeira” (Анна Первая), em que ressalta seu pioneirismo no front feminino da literatura russa – em que
pese Anna não tenha sido, de fato, a primeira escritora russa, mas a primeira a
fazer sucesso.
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